Fluxos globais de mercadorias no pós-pandemia

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A pandemia da Covid-19 irá, provavelmente, afetar os fluxos globais de mercadorias de forma mais profunda do que qualquer outra crise recente. Os líderes com uma perspetiva bem informada sobre potenciais cenários comerciais podem começar a uma recuperação a partir de uma posição de força.

Ao testemunharmos a resposta notavelmente determinada das autoridades de saúde, a nível mundial, face à pandemia da Covid-19, percebemos também que os agentes económicos das mais diversas áreas respondem aos desafios atuais com a inovação. A logística global não é exceção. A pandemia, muito provavelmente, atingirá os fluxos globais de mercadorias, e consequentemente o comércio internacional, mais profundamente e durante mais tempo do que observámos em crises do passado recente. A extensão da perturbação irá variar consoante a mercadoria, a rota comercial e o modo de transporte, e será orientada por diferenças locais na gravidade da crise. A natureza subtil da crise gera oportunidades para as empresas de logística e cadeia de abastecimento, nomeadamente, entrar em novos mercados, inovar na oferta de serviços e posicionar-se competitivamente face aos concorrentes. Uma compreensão detalhada do impacto da crise é vital para as empresas, uma vez que à medida que o seu foco se altera de refletir numa resolução transporte de emergência para planear o regresso à normalidade.

Um impacto mais profundo e prolongado no comércio do que as crises anteriores

Uma pesquisa recente da McKinsey Global Institute, estima que a procura global de comércio sem restrições (fluxos globais de mercadorias) possa cair entre 13 a 22% no segundo e terceiro trimestres de 2020. Em contrapartida, o maior decréscimo trimestral dos volumes comerciais durante a crise financeira global de 2008 foi de cerca de 5%.

As estimativas para o desenvolvimento do comércio global estão enraizadas em nove cenários, desenvolvidos pela McKinsey em parceria com a Oxford Economics, que modelam os diferentes caminhos que a economia global pode seguir, com base em pressupostos em torno da eficácia das respostas da saúde pública e da política económica, bem como na forma como as empresas e as famílias reagem a estas iniciativas. Uma modelação detalhada da oferta e da procura por mercadoria, indica que o efeito sobre o comércio global será substancialmente maior do que no PIB global (que, para comparação, estima-se uma redução de 3 a 8% em 2020) e consideravelmente mais longo.

Nos cenários modelados, os volumes comerciais demorarão 15 a 48 meses a recuperar para os níveis do quarto trimestre de 2019, e o valor perdido será equivalente a 8 a 49 por cento do volume comercial total de 2019. As empresas de comércio e logística já estão a sentir as consequências, com várias empresas de transporte rodoviário, aéreo  e marítimo  a reportarem grandes quebras de volume face ao mesmo período do ano passado.

Dimensão do impacto vai variar consoante a mercadoria, a rota comercial e o modo de transporte

O impacto da crise vai variar significativamente em função da mercadoria, do modo de transporte e a duração da perturbação determinada tanto pelos choques de abastecimento, como pelas economias que sofrem bloqueios e choques de procura devido à desaceleração económica global.

Por exemplo, num cenário de resposta eficaz à saúde e de intervenções económicas parcialmente eficazes, o volume de comércio a curto prazo dos automóveis (bens dispendiosos e duráveis) deverá diminuir mais de 50%, devido às paragens nas fábricas e à diminuição das despesas discricionárias por parte dos consumidores. Por outro lado, o volume comercial de cereais (produtos básicos de consumo) não deverá diminuir mais do que 5%. A oferta diminuirá apenas ligeiramente devido ao elevado grau de automatização da produção e à dispersão do panorama dos fornecedores, e o aumento da procura de consumo alimentar doméstico compensará a diminuição do consumo fora de casa.

O grau de afetação de cada modo de transporte e rota comercial depende da composição específica de mercadorias. Ao planear o futuro, os agentes da indústria devem, assim, utilizar insights com base nas matérias-primas.

De acordo com a pesquisa da McKinsey, a procura global de carga aérea não constrangida diminuirá 14% face aos volumes pré-crise no segundo trimestre de 2020, e só voltará aos níveis de 2019 em meados de 2022.

A queda da procura para o transporte marítimo será semelhante, embora a recuperação possa demorar um pouco mais. No transporte marítimo, a queda será menor para a carga seca a granel do que para a carga contentorizada, uma vez que a primeira categoria se refere produtos menos afetados pela atual crise, como os produtos agrícolas. Assim, é esperado que a tonelagem de carga seca granel e contentorizada desça 14% e 16% dos volumes pré-crise, respetivamente. Dentro da carga contentorizada, as unidades equivalentes de vinte pés (TEUs) terão um impacto maior do que a tonelagem, caindo em 19% dos volumes pré-crise; isto resultará, provavelmente, num maior impacto das receitas e num custo de combustível superior à média, uma vez que os contentores são mais pesados, em média, do que antes do COVID-19.

O efeito da crise nas rotas comerciais individuais também variará significativamente consoante o desenvolvimento da Covid-19 em cada país e de acordo com o modo de transporte utilizado. No comércio marítimo contentorizado, por exemplo, a queda da procura variará de 6% nas exportações sul-americanas para a Europa, (que consistem maioritariamente em produtos agrícolas) para 20% em algumas exportações asiáticas (que predominantemente consistem em maquinaria e equipamentos). Se as respostas de saúde pública permitirem o controlo rápido e eficaz do vírus, então estes declínios podem limitar-se a cerca de 2 a 11 por cento. No entanto, podem atingir os 8 a 27 por cento no caso de intervenções económicas ineficazes.

Em todos os cenários, o impacto nas exportações asiáticas deverá ser maior do que nas importações asiáticas, e o impacto nas rotas comerciais leste-oeste deverá ultrapassar o impacto nas rotas norte-sul. Esta variação pode ser fundamentada tanto na recuperação projetada das economias importadoras – por exemplo a economia chinesa, deverá recuperar mais rapidamente do que a economia da Europa e ou dos Estados Unidos – e na categoria de mercadorias.

Enquanto os líderes empresariais estão a gerir as perturbações e os meios de subsistir à pandemia, devem também refletir sobre como se moldar para prosperar dentro do “novo” normal. Interiorizar uma consciência em tempo real das tendências da procura nos processos de planeamento de negócios é a forma mais segura de gerar os conhecimentos oportunos necessários para remodelar o core business, procurar oportunidades estratégicas e encontrar novas formas de trabalhar. Por exemplo, as empresas globais de logística (como transportadoras ou despachantes) podem tomar decisões informadas sobre a implantação de ativos e talentos ou redirecionar a sua força de vendas para mercadorias ou rotas comerciais menos impactadas ou com perspetivas de recuperação mais rápidas. Empresas como fornecedores de infraestruturas e operadores também podem avaliar de forma rápida e precisa os seus planos de investimento de capital em cenários alternativos, e os agentes do setor poderiam avaliar e otimizar os seus portfólios ou estratégia de fusões ou aquisições por geografia ou modo.

Referências Bibliográficas:
Artigo adaptado de Global freight flows after COVID-19: What’s next?, julho de 2020, Acedido em 08 de outubro de 2020, em https://www.mckinsey.com/industries/travel-logistics-and-transport-infrastructure/our-insights/global-freight-flows-after-covid-19-whats-next

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